Por: Neumanne Nery
Devemos promover espaços diferentes de aprendizagens, sair das quatro paredes escolares, desafiar nossos educandos vindo a explorar suas inteligências, talentos e capacidades, que por muitas vezes preferem a internet, às ruas, os desafios cotidianos extra sala de aula, e, estão esperando que os desafiemos com atividades diferentes, inovadoras e dinâmicas e serem protagonistas dessas atividades. São importantes os livros, o quadro e o giz e/ou lápis? Sim, são! Mas, esses recursos por si só são insuficientes, cansativos e entediantes.
Paulo Freire em seu livro Pedagogia da Autonomia questiona: “Por que não discutir com os alunos a realidade concreta que se deva associar a disciplina cujo conteúdo se ensina, a realidade agressiva em que a violência é a constante e a convivência das pessoas é muito maior com a morte do que com a vida? Por que não estabelecer uma necessária “intimidade” entre os saberes curriculares fundamentais aos alunos e a experiência social que eles tem como indivíduos? Por que não discutir as implicações políticas e ideológicas de um tal descaso dos dominantes pelas áreas pobres da cidade? A ética de classe embutida neste descaso? A escola tem alguma coisa a ver com isso? A escola não tem partido e/ou não deve ter partido, ela tem que trabalhar os conteúdos associando-os ao cotidiano dos alunos. Aprendidos, estes operam por si mesmos”(1996, p.33-34).
Eduardo Chaves fala bem em seu texto “Educação Orientada para Competências” e “Currículo Centrado em Problemas, sobre ao que me refiro, quando digo que nossos educandos são inteligentes e capazes e que precisam ser desafiados e protagonistas de aprendizagens diversas, reforçando também as palavras supracitadas por Freire. Gostei muito do texto e por isso fielmente o reproduzo neste espaço. O Eduardo Chaves diz: “Nossa educação hoje, e por um bom tempo, não tem sido orientada para o desenvolvimento de competências e habilidades nos alunos, mas, sim, para a absorção, por parte deles, de conteúdos informacionais: fatos, conceito e procedimentos. Os currículos utilizados nesse tipo de educação, por sua vez, são centrados, não na análise e na tentativa de solucionar problemas, mas em disciplinas, que são o repositório dos conteúdos informacionais mencionados, e que, em geral, são apresentadas aos alunos de forma abstrata, totalmente desvinculada dos problemas fundamentais que um dia levaram o ser humano a se interessar por esse tipo de questão. Assim, a aprendizagem dos alunos é caracterizada como a absorção dos conteúdos informacionais das várias disciplinas que compõem o currículo, e espera-se que essa aprendizagem seja o resultado mais ou menos automático de um ensino que, o mais das vezes, não vai além da mera apresentação de parte dos conteúdos a serem absorvidos – a outra parte ficando por conta dos livros didáticos, cuja leitura também se espera que vá redundar em aprendizagem (i. e., na absorção dos conteúdos informacionais que foram lidos).
Quando se afirma que a escola precisa encontrar novas formas de ensino e aprendizagem, se deseja sobreviver os momentos difíceis que atravessa não se tem em mente apenas aperfeiçoar as atuais formas de ensino e aprendizagem, torná-las mais eficientes e, ao mesmo tempo, como se fosse possível, mais agradáveis. O que critica é o próprio modelo, ou paradigma de aprendizagem, e, conseqüentemente de ensino, que hoje impera. Conseqüentemente, é preciso “virar as costas de ponta cabeça’ recomeçar do zero.
É interessante notar que o modelo ou paradigma que hoje é hegemônico não possui fundamentação teórica ou justificativa séria. Quando as coisas são colocadas nestes termos, poucos são os que explicitamente endossam a tese de que educar é ensinar às crianças os fatos, os conceitos e, se for o caso, os procedimentos envolvidos nas várias disciplinas: história, geografia; ciências ou, especificamente, biologia, física, química; matemática; filosofia; língua materna; uma língua estrangeira. Esse modelo ou paradigma foi se infiltrando na escola, e acabou alcançando condição de hegemonia, apenas porque é mais fácil de ser colocado em prática do que as alternativas. Na realidade, ele contradiz virtualmente tudo o que sabemos sobre o que é que motiva as crianças a aprender e como elas de fato aprendem.
Não se pode ignorar que antes de entrar na escola a criança aprende uma quantidade enorme de coisas: aprende a diferenciar a suas impressões sensoriais e a identificar objetos e pessoas; aprende a pegar e a manipular objetos; aprende a ficar de pé e eventualmente a andar; aprende a pegar e a manipular objetos; a ficar de pé e eventualmente a andar; aprende a gostar de determinadas coisas e a não gostar de outras, desenvolvendo nítidas preferências; aprende a responder adequadamente ao contato de terceiros (conhecidos ou estranhos); aprende a identificar sons, em especialmente os sons da fala humana; aprende primeiro a expressar o que deseja através de gestos e sinais, a aprender a imitar gestos e sons e, eventualmente, aprende a falar; aprende a se alimentar sozinha; aprende a controlar sua bexiga e seus intestinos; aprende que não deve fazer determinadas coisas; aprende a demonstrar carinho e a agredir os outros, quando contrariada; aprende eventualmente a identificar símbolos, desenhos, sons e mesmo palavras escritas com seus referentes – e assim por diante. Algumas crianças aprendem até mesmo a ler e a escrever virtualmente sozinhas. Outras crianças aprendem a se locomover, sem se perder, em espaços relativamente complexos- como um sítio ou mesmo as ruas de uma grande cidade.
Registre-se, porque de fundamental importância, que nenhum desses aprendizados envolve a absorção pura e simples de informação – em todos eles o essencial é o desenvolvimento de competências e habilidades – sensório-cognitivas, psicomotoras, emocionais e sociais (interpessoais). Registre-se ainda que em nenhum desses casos haja um processo de ensino formal e institucionalizado: a criança aprende observando, imitando, e respondendo a intermitentes intervenções (estimulações ou provocações, no bom sentido) daqueles que compartilham o seu mundo.
Além do mais, aprender todas essas coisas dá grande prazer às crianças – sua curiosidade inata as torna automotivadas e em nenhum momento o aprendizado lhes parece doloroso ou entediante. Aprender é parte de sua vida – na verdade, a parte principal da sua vida. Brincar, para elas, é aprender, e aprender é brincar. Por fim, ajudar as crianças a aprender essas coisas todas é um processo relativamente simples – até as pessoas mais simples, sem educação geral e sem formação especializada na área de pedagogia da pré-escola, conseguem ajudar a criança nesse processo alegre de aprendizado.
Se, ao entrar na escola, o aprendizado subitamente se torna aborrecido e mesmo sofrido para as crianças, isto parece ser muito mais por falha da escola do que das próprias crianças – pois nada fundamental se altera nelas, além do fato de que seu aprendizado agora deve se processar principalmente no ambiente organizado e estruturado da escola, que altera drasticamente a natureza do processo de aprendizagem”.
Acredito que, se a escola se organizar com aulas diferenciadas, dinamicas, iniciadas entre as quatro paredes e complementadas com outros fazeres pedagógicos, o estimulo e as surpresas serão diversas. As inteligências são múltiplas e isso é fator relevante quando promovemos ambientes estimuladores carregados de gente que faz e acontece.
Utópica? Sim, sou! Mas utópica no sentido de sonhar e acreditar que juntos faremos a diferença, mesmo que a longo prazo, não importa, o importante é sonharmos juntos porque assim esse sonho se tornará real.
Finalizo este texto citando o querido e imortal Educador Paulo Freire (reforçando o texto "Paulo Freire, defensor da justiça e do professor...) que me estimula a sonhar e não desistir de lutar por um mundo melhor e em seguida um comentário sobre o seu livro.
“...Não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino. Esses que-fazeres se encontram um no corpo do outro. Enquanto ensino continuo buscando, reprocurando. Ensino porque busco, porque indaguei, porque indago e me indago. Pesquiso para constatar, constatando, intervenho, intervindo educo e me educo. Pesquiso para conhecer o que ainda não conheço e comunicar ou anunciar a novidade... “
“... se nunca idealizei a prática educativa, se em tempo algum a vi como algo que, pelo menos, parecesse com um que-fazer de anjos, jamais foi fraca em mim a certeza de que vale a pena lutar contra os descaminhos que nos obstaculizam de ser mais. Naturalmente, o que de maneira permanente me ajudou a manter esta certeza foi a compreensão da História como possibilidade e não como determinismo, de que decorre necessariamente a importância do papel da subjetividade na História, a capacidade de comparar, de analisar, de avaliar, de decidir, de romper e por isso tudo, a importância da ética e da política.
É esta percepção do homem e da mulher como seres “programados, mas para aprender” e, portanto, para ensinar, para conhecer, para intervir, que me faz entender a prática educativa, como um exercício em favor da produção e do desenvolvimento da autonomia de educadores e educandos. Como prática estritamente humana jamais pude entender a educação como uma experiência fria, sem alma, em que os sentimentos e as emoções, os desejos, os sonhos devessem ser reprimidos por uma espécie de ditadura reacionalista. Nem tão pouco jamais compreendi a prática educativa como uma experiência a que faltasse o rigor em que se gera a necessária disciplina intelectual.
Estou convencido, porém, de que a rigorosidade, a séria disciplina intelectual, o exercício da curiosidade epistemológica não me fazem necessariamente um ser mal amado, arrogante, cheio de mim mesmo. Ou, em outras palavras, não é minha arrogância intelectual a que fala de minha rigorosidade científica. Nem a arrogância é sinal de competência nem a competência é causa de arrogância. Não nego a competência, por outro lado, de certos arrogantes, mas lamento neles a ausência de simplicidade que, não diminuindo em nada seu saber, os faria gente melhor. Gente mais gente”.(1996, p.32 e 164-164).
“Na busca permanente de aprendizado, poucas vezes encontramos textos apropriados como este. Nele Paulo Freire nos ensina a ensinar partindo do ser professor. Numa linguagem acessível e didática ele reflete sobre saberes necessários à prática educativo-crítica fundamentados numa ética pedagógica e numa visão de mundo alicerçadas em rigorosidade, pesquisa, criticidade, risco, humildade, bom senso, tolerância, alegria, curiosidade, esperança, competência, generosidade, disponibilidade... molhadas pela esperança. Comentário de Moacir Gadotti sobre o livro Pedagogia da Autonomia – saberes necessários à prática educativa.
Consciente da minha imperfeição jamais perderei a esperança em viver a cada dia um novo dia e busco companhias de pessoas críticas, pesquisadoras, humilde, de bom senso, tolerante, alegre, curiosa, esperançosa, competente, generosa, imperfeita, mas com disponibilidade para ajudar, para educar com vontade, paciência, determinação e acima de tudo também molhadas pela esperança. Um abraço. Neumanne Nery.